5 de abr. de 2023

Memória Olfativa - Simone Shitrit e Guerlain L'Heure Bleue

 


Há alguns perfumes dos quais eu sempre tive dificuldade de escrever. Isso não acontece por eu não ter uma conexão com eles ou não ser capaz de entendê-los. Mas tais perfumes são monumentos dos quais eu me sinto pequeno e pouco capaz de traduzir em palavras a importância e beleza que eles possuem. São perfumes especiais e ainda que não sejam conhecidos do grande público são obras de arte das quais somos privilegiados de termos acesso.

Um desses perfumes está associado a uma memória olfativa que eu também acreditava ser difícil de escrever. Mas que para a minha alegria eu posso retratá-la dado que ela representa um momento pivotal da minha vida também, uma grande influência tanto quanto a obra de arte que é o L'Heure Bleue. Esse é um dos perfumes favoritos da minha amiga Simone Shitrit, uma amizade que eu recentemente tive a alegria e sorte de poder reconectar, o tipo de alegria que sentimos quando somos capazes de reencontrar um perfume raro que amamos muito.

A Simone entrou na minha vida bem no começo da minha jornada da perfumaria, em um tempo onde eu dava meus primeiros passos para pensar em trabalhar com perfumaria e escrever sobre o assunto. Um dia descobri seu blog e fiquei encantado com o nível do conteúdo - um olhar artístico, profundo e complexo que poucas pessoas são capazes de demonstrar em português. Na época resolvi me arriscar e mandei um email para a Simone elogiando seu trabalho e perguntando mais sobre como seria possível seguir o caminho da perfumaria como profissão. E o que surgiu disso foi uma amizade que eu nunca imaginaria que brotaria. Uma amizade inclusive muito intensa e que me transformou para sempre.

Eu via a perfumaria a partir do meu limitado mundo de um rapaz jovem e com pouca experiência de vida. A Simone me trouxe um olhar diferente, mais sábio, artístico e intenso. Eu diria que eu sempre fui esforçado e consegui me desenvolver pelo esforço mas minha amiga tem esse talento artístico que é simplesmente natural a ela e é uma das coisas que eu sempre admirei. A Simone abriu meus horizontes e indiretamente me influenciou inclusive nas minhas preferências olfativas - uma vez ela me aconselhou a que eu passasse a avaliar e escrever sobre todos os tipos de perfumes, inclusive das famílias olfativas que eu não gostava. E isso me levou a descobrir um amor pelas flores brancas, das quais eu tinha uma certa repulsa no passado.

Eu admiro a Simone da mesma maneira que admiro o L'Heure Bleue - ambos são únicos, artísticos e multifacetados. As pessoas são como os perfumes, algumas te trazem uma certa sofisticação clássica que é inesquecível e que te demanda tempo para ser apreciado e entendido em toda a sua beleza. São perfumes e pessoas que muitas vezes um rapaz jovem é incapaz de entender em seus detalhes mas que o tempo e a maturidade certamente ajudam.